[Resenha feita como tarefa para a disciplina "Introdução aos Estudos Tradutológicos", com a professora Adriana Zavaglia, em 2013]
O livro de Arrojo inicia-se
explicando o que devemos entender sobre oficina
de tradução e qual é a importância da abordagem de uma oficina para o campo
da prática da tradução, mostrando que a teoria tem um lugar importante junto à
prática e que a reflexão sobre alguns temas podem ser necessários no processo
de traduzir. Ela confessa que o título surgiu de uma experiência própria da
autora, a qual se reunia com estudiosos do assunto em sua passagem pela
Universidade John Hopkins (Baltimore, EUA) e aproveita para questionar a
relação de ideias e a fidelidade entre “oficina
de tradução” e “translation workshop”.
No segundo capítulo, Arrojo
aborda a questão do texto original, explicando que, na concepção dos
estudiosos, o ponto principal do processo tradutológico é o de que o
significado da língua original deve alcançar a língua-alvo, de uma forma compreensível
e equivalente para os receptores do texto, mas isso ocorre dentro de uma visão tradicional
desse campo, onde há três princípios básicos que definem uma boa tradução: deve
reproduzir em sua totalidade a ideia do texto original, o estilo deve ser o
mesmo e a tradução deve ter toda a influência e naturalidade do texto original
(retirados, segundo a autora, do livro The
Principles of Translation, de Susan Bassnett, 1791). A autora também a
questão que Borges colocou quanto à tradução de seu personagem fictício Pierre
Menard de Don Quixote para o francês:
o tradutor concebe um projeto seguindo a visão tradicional, onde a obra de
Cervantes pode ser traduzida em sua equivalência para a língua-alvo. Menard
acreditava nos preceitos de Descartes de que poderíamos construir uma linguagem
universal, uma verdade única e absoluta tornando sua tradução um trabalho
invisível; a autora afirma que ele tenta recuperar o significado “original” de
Cervantes, mas somente consegue reproduzir suas palavras, mostrando o quando é
importante uma interpretação nesse
processo.
Na questão do texto literário,
temos por base alguns poemas originais e traduzidos para desmistificar o que os
escritores e poetas criticam sobre “destruir e descaracterizar” um texto
literário. Muitos poetas e escritores acreditam que a tradução é uma prática
inferior, já que não consegue capturar o real sentido ou significado do texto
literário, levando em conta a interação de forma
e conteúdo dentro desse gênero. Em uma das abordagens de Menard, a literariedade
de um texto seria perdida caso não houvesse qualquer alteração, perdendo seu
caráter literário e tornando esse gênero “intraduzível”. Contudo, temos que
tentar ver esse texto como uma convenção em que haja alguns significados
poéticos que podemos interpretá-los e traduzi-los mantendo um sentido para eles
na língua-alvo. Portanto, a tradução de um texto literário precisa ser antes de
traduzida, lida e interpretada pelo profissional da tradução, para que o
sentido literário seja o mais próximo possível do original, mesmo que este
requeira modificações necessárias.
Quando vamos estudar o campo da
fidelidade na tradução (já abordado quando se tratou de Menard), Arrojo nos dá
um exemplo bastante didático: o de uma fantasia de Cleópatra em diferentes locais
e tempos históricos, a qual a diferenciação entre elas parece gritante quando
levamos em conta a sociedade e as opiniões da época, onde diferentes
interpretações de uma mesma pessoa “original” se chocam em diversidade. Isso
tudo para ilustrar como um mesmo texto original pode ser traduzido de diferentes
maneiras se levarmos em conta que o contexto social e histórico do público-alvo
e como o contexto em que ele foi escrito pode ser difícil de ser resgatado, já
que podem ser universos e visões diferentes entre autor e tradutor. O autor,
então, passa a ser um dos constituintes da interpretação daquele texto;
contudo, cabe ao tradutor a tomar a decisão de como irá abordar o conceito a
ser traduzido, já que ele tem o poder de interpretar da forma dele e propor um
projeto próprio para o seu trabalho, onde o leitor também tem o seu papel
interpretativo e o escritor acaba “perdendo” a soberania da autoria de seu
texto. Com isso, podemos presumir que fidelidade nada mais é do que o projeto, visão
e suposição, os quais o tradutor se diz fiel e que a comunidade interpretativa
seja alcançada de forma que o texto seja claro para os falantes e ouvintes da
língua-alvo. No caso da poesia, a tradução deve também ser fiel (o máximo
possível) ao que o poema se propõe ao leitor, de qualquer língua.
No capítulo cinco, A teoria na prática, a autora nos propõe
uma comparação entre o poema de Carlos Drummond de Andrade, Áporo, e a sua tradução para o inglês
feita por John Nist, Insect. Partindo
do pressuposto de que para traduzir um poema é necessário que o tradutor fique
atento ao que ele próprio deverá enfatizar, criar e manter, a autora faz uma
breve análise pessoal do poema, mostrando as diferenças e igualdades entre os
dois textos. Arrojo foca em tópicos como repetições de sons (assonâncias, ecos
de sílabas semelhantes), a escolha de palavras equivalentes e assim por diante.
A autora afirma que “o jogo de leitura
poética não deve descartar nenhum fragmento que possa ser empregado na
construção de uma interpretação” (ARROJO, pág. 52), ou seja, quando lida
com o gênero poético, tradutor deve ficar atento para não perder nenhum traço
interpretativo desse texto; ainda que não consiga manter todos os pontos do
texto original, a faculdade interpretativa deve ser priorizada para que o
leitor da língua-alvo consiga capturar a totalidade que esse gênero
proporciona. Finalmente, a autora propõe uma nova tradução, de sua autoria e
estabelece os pontos que priorizou, que modificou e manteve do original e da
tradução anterior.
Há ainda um capítulo destinado à exercícios
de tradução, em que a autora mostra dois poemas diferentes, um original da
língua portuguesa traduzido para o inglês (Poema
de sete faces, de Drummond, com tradução de Elizabeth Bishop, Seven-sided poem) e um original da
língua inglesa traduzido para o português (The
Rival, de Sylvia Plath, com tradução de Luiz Carlos de Brito Rezende, Rival), apontando tópicos pertinentes
para o aprendiz da tradução.
Após o vocabulário crítico dos
tradutores, Arrojo dá ao leitor alguns recados que sumarizam o ponto principal
da obra: além de traduzir, o tradutor precisa ler criticamente, estudar sobre o assunto do texto e fazer com que
este seja aceitável e pertinente para o público-alvo; sempre com a curiosidade
aguçada e interessado em captar exatamente o que aquele termo e/ou conceito
problemático realmente significa, o tradutor tem que ter o mesmo cuidado que o
próprio escritor teve ao traduzir um texto. Concluindo, traduzindo é uma
atividade complexa e exige esforço, paixão e paciência do profissional para que
seu trabalho seja de qualidade e reconhecido.